PREVENÇÃO OU
REPRESSÃO
Gostaria de compartilhar algumas reflexões que
julgo de extrema relevância. Assim, parte-se da seguinte pergunta:
Para que se
tenha uma boa saúde, basta ser atendido pelo melhor médico?
Com certeza a
resposta será não. Afinal, para que tenha uma boa saúde, faz-se necessário que você
adote comportamentos saudáveis de alimentação e atividade física.
E para que se
tenham dentes lindos, basta procurar o melhor dentista? Por óbvio que não. Para
que se tenham bons dentes, é fundamental que você efetue a higiene bucal todos
os dias.
Para se tenha
uma boa educação, basta ter o melhor professor ou pagar a melhor escola? Por
certo que também não. Para que se tenha uma boa educação escolar, é essencial
que você se dedique, se esforce e estude.
Ora, por que
com a segurança as pessoas pensam diferente?
Por mais que se
tenha a melhor instituição policial, isso não bastará para que você se sinta
seguro. É imperioso que você adote condutas de segurança e autoproteção.
Achar ou
sonhar (este é o verbo, sonhar) com um policial em cada esquina é utopia e é
uma medida pautada somente no tratamento da consequência. O pensamento na área
segurança para ser efetivo deve buscar o equilíbrio entre as ações de prevenção
e repressão, ou seja, deve acompanhar a lógica da área da saúde, tratando não
só a consequência, mas, sobretudo, a causa do problema.
Em pormenores,
imagine que você esteja com uma dor de cabeça e você vai ao médico para tratá-la.
Para que possa tratar, com certeza, a equipe de saúde não irá apenas lhe
receitar um analgésico para inibir a dor, mas sim, prescreverá exames com o
intuito de buscar a causa que está a gerar esta dor. Diversos podem ser os
motivos que poderão desencadear uma dor de cabeça, tal como, pressão alta ou
sinusite, dentre outros. Saber a causa e trata-la é solucionar de forma efetiva
o problema.
É justamente
neste sentido que deve ser conduzido o pensamento na área da segurança, para
agir sobre as causas do problema, para atuar no campo da prevenção. Isto é, não basta apenas responder
ao incidente (sem desconsiderar a importância da resposta ao incidente), mas se
deve buscar resolver a causa do problema.
Certa vez fui
chamado para uma reunião em que um comerciante da Rua Padre Roma, no Centro de
Florianópolis, reclamava que seu estabelecimento havia sido arrombado duas
vezes em um mês. Ao término da fala do comerciante, após registrar que nas duas
ocorrências os criminosos foram presos e os produtos recuperados, fiz a
seguinte pergunta ao comerciante: O que os comércios vizinhos ao senhor possuem,
que o seu não possui?
O criminoso
escolhe sua vítima, em um processo decisório simples, em que analisa a
recompensa que obterá com o crime, o risco a que estará submetido e a
vulnerabilidade do estabelecimento ou o esforço que terá para realização do
crime.
Então, o
comerciante compreendeu o porquê que os outros seis comércios da mesma galeria
não foram vitimados e o seu em um mês o foi duas vezes. Os dois arrombamentos
ocorreram com o modus operandi mais
usual dos usuários de drogas, arremessando uma pedra e quebrando a vitrine.
Ora, os demais comércios, além da barreira perimetral de vidro possuíam um
dispositivo de contenção (grade ou esteira). Em se colocando o dispositivo de
contenção, provavelmente, este não seria mais um problema.
O modelo
policial brasileiro precisa ir para além do modelo profissional
norte-americano, em que o foco está apenas nas consequências do crime e o
pensamento é pautado numa lógica
repressiva em que o objetivo passa a ser o combate ao crime e não a qualidade
de vidas das pessoas.
A torneira
pinga e molha o chão; e a solução não está no pano secando o chão. O pano, em
breve, ficará úmido, se encharcará e a torneira continuará a pingar. Esse é o
modelo brasileiro, focado no chão molhado (consequência), esquecendo que a
solução se encontra no conserto da causa que faz a torneira pingar. E para
conhecer a causa, faz-se necessário conhecer o problema, afinal, ninguém
gerencia aquilo que não conhece.
Equilíbrio
entre ações preventivas e repressivas, atuar sobre as causas e as consequências
de maneira harmônica, tendo a comunidade como parceira ou corresponsável, é o
que se acredita para construir cidades mais seguras.
É, justamente
nesse cenário, que o presente texto tenta contribuir para a missão policial
militar de prestar segurança pública com o fim de preservar a ordem pública e
incolumidade das pessoas e do patrimônio, pois não há como compreender uma
instituição prestando algo que não conhece.
Talvez esse
seja o ponto de partida e o mais importante passo no processo para o resgate da
vida em sociedade de maneira pacífica e harmoniosa. Afinal, cumpre frisar que,
por mais que tente distorcer tal verdade, os policiais militares são os
guardiões da ordem, da lei, das garantias e direitos individuais e coletivos. O
exercício pleno da cidadania e o respeito aos direitos humanos jamais seria
possível sem a existência das polícias militares. Por isso, conhecer os limites
das atribuições policiais passa ser assunto fundamental na materialização do
Estado Democrático de Direito.