quarta-feira, 22 de agosto de 2012

O Poder de Polícia Administrativa da Polícia Militar


Na qualidade de instrutor do Centro de Ensino da Polícia Militar de Santa Catarina, em específico, ao lecionar a disciplina de Direito Administrativo, observei que muito se tem ainda a esclarecer sobre os reais limites do poder de polícia administrativa advindo da missão constitucional das Polícias Militares. Aliás, em que pese a Constituição Federal está a completar seus 24 anos, pude perceber recentemente, acompanhando o parlamento no Congresso Nacional, que os conceitos de polícia ostensiva e preservação da ordem pública são obscuros e cinzentos para muitos. Não por outra razão, de maneira objetiva, procuro a este momento contribuir, uma vez que conhecer e compreender o significado do poder de polícia ostensiva e do poder de polícia de preservação da ordem pública se faz indispensável para o exercício da cidadania e segurança jurídica.

Neste sentido, convém mencionar que o poder de polícia administrativa é a faculdade que dispõe a Administração Pública para intervir condicionando e restringindo o uso e gozo de atividades, bens e direitos individuais, em benefício da coletividade e do interesse público. Em termos práticos, sempre que o bem, o direito ou as atividades dos particulares afetam a coletividade, o poder de polícia administrativa permite ao Estado intervir em proteção ao interesse público.  Este limite conceitual, embora não haja delimitação legal, encontra-se pacificado pela doutrina e jurisprudência.

Entretanto, ao se esmiuçar o gênero poder de polícia administrativa, verifica-se que o mencionado poder divide-se em poder de polícia administrativa especial e o poder de polícia administrativa geral. A este ponto, justamente, que reside o ledo engano, ao não distinguir as espécies de poder de polícia administrativa.
O poder de polícia administrativa especial é aquele que se dilui por toda a administração pública, exercido por um agente fiscalizador, que incide somente sobre bens, serviços e patrimônio. Noutras palavras, não permite agir sobre pessoas, ou seja, o agente público realizar busca pessoal, busca veicular e barreira. Ademais, o exercício do poder de polícia especial se dá por órgãos ou departamentos, não tendo estrutura de instituição. Cabe destacar que a ação fiscalizadora não tem por objeto a ordem pública, tendo competência muito mais estreita, que lhe permite atuar de forma específica no ramo de atividade que lhe cumpre fiscalizar. Em sentido material, por exemplo, os fiscais das secretarias do meio ambiente atuam no aspecto tranqüilidade (poluição sonora); os fiscais da vigilância sanitária, sobre a salubridade; dentre outros.

Por outra esteira, o poder de polícia administrativa geral é também conhecido como poder de polícia de preservação da ordem pública, o qual por força constitucional foi incumbido às polícias militares. Neste sentido, difere-se do poder de polícia administrativa especial por possuir competência mais abrangente, uma vez que, além de incidir sobre bens, serviços e patrimônios, também age sobre pessoas. Importa destacar que o seu exercício é voltado para todos os aspectos da ordem pública, quais sejam, salubridade, segurança e tranqüilidade; tendo formato de instituição, que se caracteriza por uma atuação mais discricionária. Destarte, sua previsão é constitucional, enquanto que o poder de polícia administrativa especial possui estatuição legal. Salienta-se que o poder de polícia administrativa geral permite ao agente público exercer o poder soberano do Estado, inclusive com o uso da força para que a ordem pública seja preservada e, quando quebrada, restabelecida.

Percebe-se, pois, que o poder de polícia administrativa especial é o poder de polícia dos agentes públicos “fiscalizadores”, por outro lado, o poder de polícia administrativa geral (poder de polícia da preservação da ordem pública) é o poder de polícia da polícia. 

Indispensável evidenciar que a Constituição Federal taxou as Polícias Militares e Polícias Civis como as forças policiais dos Estados-Membros, estatuindo que às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública, enquanto que às policias civis competem a polícia judiciária e apuração das infrações penais. Evidencia-se do sistema de segurança formatado pela constituinte que se impôs às policiais militares da missão de prevenir e restabelecer (repressão imediata) a ordem pública, por isso, a natureza institucional das Polícias Militares ser tipicamente administrativa. Vale lembrar que a prevenção (missão da Polícia Militar) se dá por normas administrativas e não por leis penais ou processuais penais. Neste norte, as Polícias Civis por sua atribuição constitucional, possuem natureza judiciária, qual seja, investigar elementos de autoria e materialidade. Em resumo, fundamental pontuar que a atividade de prevenção se materializa por regras e normas de direito administrativo e a atividade judiciária se dá na esfera penal, como ultima ratio.

Esclarecido este ponto, vale dizer que o poder de polícia administrativa geral se concretiza por ações do poder de polícia ostensiva, motivo pelo qual a constituição delimitou como competência das Polícias Militares a polícia ostensiva. De pronto, é importante ressaltar que polícia ostensiva é diferente do policiamento ostensivo (previsto nas Constituições anteriores), uma vez que o simples policiamento ostensivo se consubstancia tão somente na atividade de fiscalização da ordem pública e, assim, da ordem jurídica para que sejam preservadas. A Constituição Cidadã de 1988 delegou às Polícias Militares uma missão mais ampla, visto que a competência polícia ostensiva tem sua abrangência para além da mera fiscalização, permitindo a instituição de polícia ostensiva ordenar, consentir, fiscalizar e sancionar os bens, atividades e direitos individuais que conflitam com o interesse coletivo.

Destarte, por finalizar, a polícia ostensiva compreende a faculdade da Polícia Militar, que reconhecida de relance pela farda e por equipamentos, pratica atos administrativos de ordenação, de consentimento, de fiscalização e de sanção para que a ordem pública seja preservada. Em outros termos, tente imaginar como seria o trânsito nas cidades se qualquer um se achasse no direito de dirigir veículo automotor, com certeza os problemas que hoje já vivenciamos seriam catastróficos. A regulação administrativa do trânsito, em específico, a permissão para dirigir possui natureza eminente preventiva de segurança e tranquilidade, caracterizando por uma atividade de polícia ostensiva.

Por finalizar, a competência de 

domingo, 12 de agosto de 2012

Agência Brasil - Guardas Municipais e as eleições


Coluna da Ouvidoria - A participação do leitor na cobertura da Agência Brasil para as eleições municipais de 2012 | A


Brasília - As pesquisas de opinião pública têm mostrado repetidamente que um dos temas que mais preocupam o público é a questão da segurança pública. Um estudo realizado pela CNI/Ibope em 2011, por exemplo, constatou que quando os entrevistados foram solicitados a escolherem os dois principais problemas que o Brasil estaria enfrentando de uma lista de 23, saúde foi apontada por 52% da população, com a segurança pública em segundo lugar com 33% de assinalações [1]. Junto a essa preocupação, a segurança pública é a função primordial do Estado, ao qual é atribuído o 'monopólio legítimo da coação física', na conhecida conceituação do sociólogo alemão Max Weber.
No dia 17 de julho, a Agência Brasil publicou uma matéria com a seguinte observação sobre a competência dos municípios referente à segurança pública: 'Os quase 140 milhões de eleitores que irão às urnas no pleito municipal de outubro devem estar atentos às promessas dos candidatos ao cargo de prefeito.... É comum, por exemplo, um candidato prometer na campanha investimentos em segurança pública - parte dessas competências, porém, é do estado e não do município, de acordo com a Constituição. Nesse item, a incumbência do prefeito se limita à criação de Guarda Municipal ou ações de prevenção como a garantia de uma boa iluminação pública em suas cidades. A finalidade da Guarda Municipal é preservar os bens públicos e não desenvolver ações de proteção direta do cidadão, que cabem às polícias Militar e Civil, sob o comando dos governadores'[2].
Como é sabido, a realidade foge a esses padrões formais. Na falta de capacidade dos órgãos encarregados pela Constituição de desempenhar a função da segurança pública, organizações criminosas paralelas, tais como as quadrilhas ligadas ao tráfico de drogas e as milícias e outros grupos paramilitares, ocuparam os espaços vazios. Os próprios órgãos de segurança passam às vezes a disputar entre si as prerrogativas do poder e nos seus contingentes se descobrem 'bandas podres' e praticantes de atos de violência que violam o princípio da coação legítima. Empresas particulares são criadas para fornecer segurança às pessoas jurídicas e físicas que podem pagar por esse serviço.
No meio dessa situação confusa, os governos municipais se tornam alvos de demandas oriundas tanto das instâncias governamentais superiores quanto das comunidades locais por funções que extrapolam os limites estabelecidos na Constituição. Por constituir o nível do governo mais próximo à população, é natural que o município assuma algumas dessas funções. As opiniões favoráveis a um policiamento mais 'comunitário' reforçam essa tendência. Segundo os dados disponíveis na edição mais recente do Perfil dos Municípios Brasileiros do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (páginas 94 a 105), em 2009 existiam guardas municipais em 865 cidades brasileiras (15,5% do total dos municípios no país, o percentual aumentando com a população, variando de 2% entre os municípios com até 5 mil habitantes a 87,5% entre os com mais de 500 mil habitantes). 'Entre as atividades mais frequentes da Guarda Municipal pode-se citar em primeiro lugar a atividade originariamente atribuída à mesma, que é a proteção de bens, serviços e instalações do município, que ocorre em 812 dos 865 municípios com guarda. Em seguida, 725 prefeituras municipais informaram a atividade de segurança em eventos e comemorações; 644, ronda escolar; enquanto o auxílio às polícias Militar e Civil faz parte da rotina da Guarda Municipal de 609 e 468 municípios, respectivamente. O auxílio no atendimento do Conselho Tutelar mobiliza a Guarda Municipal de 543 municípios. No que concerne ao ordenamento do trânsito, sua atuação ocorreu em 513 municípios, além de exercer outras atividades [de defesa civil e controle de ambulantes, por exemplo]'. Outro dado digno de nota é que em 16,3% dos municípios onde existia em 2009, a Guarda Municipal utilizava armas de fogo. Esse percentual corresponde a 141 municípios. O percentual era progressivamente maior nos municípios com mais de 20 mil habitantes [3].
O conhecimento desses fatos ajuda a entender os motivos que levaram dois leitores do Paraná a reclamarem da explicação apresentada na matéria publicada pela Agência Brasil. O primeiro, Senhor Marcelo Peruchi (que, descobrimos no decorrer da pesquisa para essa coluna, é presidente do Sindicato dos Guardas Municipais do Estado do Paraná) escreveu: 'A matéria que fala sobre atribuições e competências dos prefeitos, quando fala sobre as guardas municipais está incorreta, é DEVER CONSTITUCIONAL dos municípios a segurança pública e as guardas municipais devem salvaguardar a vida de seus cidadãos. A maior prova disso é que em Curitiba os guardas-municipais participam efetivamente das instalações das unidades Paraná Seguro aos moldes das unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) da cidade do Rio de Janeiro, e vão trabalhar nas cidades-sedes da Copa do Mundo 2014. O segundo, Senhor Nazareno, comentou: 'Quanto a matéria ... dizendo que 'A finalidade da Guarda Municipal é preservar os bens públicos e não desenvolver ações de proteção direta do cidadão, que cabem às polícias Militar e Civil', quero manifestar que o jornalista está equivocado, pois as Guardas Municipais estão atuantes na proteção dos cidadãos em todo o Brasil, primeiramente a proteção da vida, que é o maior patrimônio que o município pode ter
Na resposta ao primeiro leitor, a Agência Brasil se abrigou no formalismo: 'Agradecemos a mensagem do leitor, mas não temos reparo a fazer à matéria publicada. Existe a PEC 534/2002, apresentada pelo então senador Romeu Tuma [PFL-SP], que estende às guardas municipais poder de polícia, mas no Senado não há registro de tramitação. Na Câmara dos Deputados, no último dia 11 de julho, consta apresentação do Requerimento de Inclusão na Ordem do Dia n. 5739/2012, do deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP), que: 'requer inclusão na Ordem do Dia da Proposta de Emenda à Constituição n.º534/2002'. No entanto, como ainda é uma proposta de mudança constitucional, não aprovada, o que está em vigor é o Parágrafo 8º do Artigo 144 da Constituição Federa
'§ 8º - Os municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei'
Na resposta ao segundo leitor, dez dias depois, a agência mostrou-se mais sensível aos argumentos apresentados: 'A sua participação é muito importante para o aperfeiçoamento do nosso trabalho. Na matéria sobre as atribuições do prefeito municipal o repórter relacionou as funções constitucionais da Guarda Municipal e as que não são objeto dela. Justamente para esclarecer essas questões para que o cidadão possa identificar o que é passível de ser prometido e realizado. Por isso o repórter explicou como diz a Carta Magna que o município tendo também responsabilidade pela segurança pública, possa incluir como órgão coadjuvante nessa tarefa a Guarda Municipal, que tem a função principal de proteger os bens, serviços e instalações, nos termos da lei, e, se solicitado, auxiliar os órgãos policiais na manutenção da ordem pública junto com as polícias Federal, Civil e Militar, além de outros previstos na própria Constituição Federal, como é o caso da Polícia da Câmara dos Deputados, com atribuições também limitadas aos fatos ilícitos daquela Casa de leis. Na realidade, o texto do repórter expôs corretamente as funções para diferenciá-las do papel constitucional das polícias estaduais e federais. No entanto, o leitor tem razão em dizer que a Guarda Municipal possa auxiliar, apoiar em outras funções quando solicitada. Por isso, sua crítica foi levada para a reunião de pauta para as devidas considerações.'
Fora dos eventuais e compreensíveis interesses corporativos dos leitores na valorização das guardas municipais, os dados demostram que seus argumentos têm fundamento e que existe uma tendência no sentido da ampliação das áreas de atuação das guardas municipais do país além dos limites previstos na Constituição. É importante que a Agência Brasil esteja consciente dessa tendência na cobertura sobre a questão da segurança pública, para que os eleitores sejam alertados a esse fato e cobrem dos candidatos definições de posições sobre o tema. Em muitos países, a polícia local é o principal órgão responsável por salvaguardar a vida dos cidadãos. É essa a direção que o povo quer que seja seguida no Brasil? As reclamações dos leitores prestaram um grande serviço em levantar esta questão. Cabe agora à Agência Brasil avançar mais do que fez nos tímidos passos dados nas respostas aos leitores.
Voltaremos em 3 de setembro após as férias anuais da ouvidora-geral.
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quinta-feira, 2 de agosto de 2012

Poder de Polícia e os Limites de atribuições das Guardas Municipais


Atendendo algumas solicitações, publico o estudo realizado no trabalho de conclusão do Curso de Bacharelado em Direito na UFSC.
Friso que se trata de uma análise acadêmica, sem qualquer pretensão de esgotar o assunto.

Para acessar, clique no link abaixo:
https://docs.google.com/open?id=0B_egqlNitj_JV19kUUpWS2NiTU0